O verde de que era tecido


Houve um campo de trigo a fustigar-me o rosto
Dum tom aloirado em meu peito de estio
E o verde de que um dia o campo foi tecido
É gume de foice noutro dia em Agosto

 
E eu querendo o verde
Do campo em meu peito
Rego-o a preceito
Para que não seque

 
Mas o vento feroz de tanto o fustigar
Secou-lhe a garganta agitou-lhe as vestes
E o peito tão verde deixou de ser verde
Dobrou-se cansado daquele balançar
 

E eu levando a sede
Do campo em meu peito

Guardo-o a preceito
E comigo bebe
 

Bebemos a água que restou do estio
Segurando as folhas com os braços frágeis
E o campo e o peito são agora homenagens
À vida tão verde e ao inevitável frio
 

E eu querendo o tapete
Dos campos em meu peito
Enrolo-o a preceito
 E com ele aqueço



Adelaide Monteiro
 

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